terça-feira, 24 de março de 2009

Entrevista com Antonieta Maria Batista (Mãe de Cristiano Veronez)

Primeira parte:

Sra. Antonieta, em que momento o Cristiano concebeu a idéia de criar um site relatando toda evolução do tratamento ao qual foi submetido? A senhora o apoiou neste projeto?

Assim que o Cristiano iniciou o tratamento oncológico de quimioterapia para a redução do tumor cerebral, o seu corpo começou a ter mudanças físicas. O cabelo caiu e por causa do uso de corticóides começou a apresentar um inchaço no corpo. Então ele queria que fotografássemos toda essa mudança que acontecia e começou a fazer um filme com fotos mostrando toda a evolução do tratamento. Porém ele esperava que o resultado da quimioterapia e depois da radioterapia fosse o suficiente para trazer-lhe a cura e que logo estaria de volta a uma vida normal. Infelizmente não foi o que aconteceu e o tumor reapareceu na coluna lombar e com isso vieram novos tratamentos, novas mudanças e novas complicações que também não eram visíveis em fotos como a diabete de insípidus e a trombose venosa profunda. Então ele desistiu do filme com fotos e resolveu criar o site contando de sua doença e de todo o tratamento pelo qual havia passado e ainda estava passando. Ele era analista de sistemas e sempre trabalhou na área. Era uma forma também de estar em atividades naquilo que ele mais gostava: a informática.
Eu sempre estive presente em todos os momentos da vida dele e principalmente neste momento que foi para todos nós um calvário. O apoiei incentivando-o a ajudar sim a outras pessoas que como ele vivia o mesmo drama. Com isso tentava encorajá-lo a não desistir nunca do tratamento e da luta. A Fé em Deus foi essencial nesta luta.


2-Qual era o principal intuito do Cristiano com a criação do site? A senhora acredita que o site o ajudou a lidar melhor com todo o sofrimento pelo qual vinha passando em decorrência do câncer?


Eu acredito que o principal intuito dele em criar o site era deixar registrado tudo que ele estava vivendo como uma forma de diário. Através do site ele tentou ajudar as pessoas que também sofriam com alguma doença e que não tinham a fé em Deus que ele julgava ser muito importante para ajudar a vencer a doença. Divulgando-o juntos aos amigos era uma forma também se sentir útil uma vez que foi obrigado a ficar em casa, pois não tinha condições de ir ao trabalho mais e isso o deixava muito triste. Outro aspecto importante do site foi que através dele passou a receber mensagens no livro de visitas de pessoas que ele não conhecia, mas que muito o ajudava com palavras de coragem força, fé. Pessoas que deixavam depoimentos de que teriam passados pela doença e que estavam curados. O site com certeza o ajudou muito a lidar com o todo o sofrimento que a doença o trouxe.

3- Em algum momento o Cristiano pensou em desistir de escrever no site?


Não. Em nenhum momento ele pensou em desistir, mas infelizmente na segunda recidiva da doença no cérebro ele foi perdendo as funções dos membros e perdeu primeiramente a força no braço direito e depois no esquerdo e ai não foi possível mais escrever. Como apresentava surdez e com dificuldades de falar não teve mais como passar a sua vontade para que pudéssemos escrever para ele. Mesmo assim resolvi postar no site as ultimas noticias, pois continuava a receber muitos e-mails querendo saber de como ele estava.

4-A senhora acredita que esse "intercâmbio" virtual de informações entre pessoas que estejam passando por situações semelhantes, ajuda na superação de problemas graves como o câncer?

Sim, eu acredito e pude viver isso na minha vida. Antes de descobrir a doença do meu filho, eu não usava site de relacionamentos. Mas diante da angústia, do desespero por procurar alguma ajuda, de encontrar uma forma de extravasar o que eu vivia comecei a usar o site de relacionamento do Orkut, pois meus filhos o usavam. Ingressei-me em várias comunidades católicas e postava tópicos pedindo orações pela cura do Cristiano. Nestas comunidades conheci e fiz muitas amizades em todo o Brasil e até mesmo no exterior, de pessoas que muito me ajudaram com palavras, mensagens, depoimentos de vivência e até mesmo orações. Recebi pílulas de Frei Galvão para fazer novena, relíquias de santos para usar junto de meu filho que me foram enviadas pelo correio por essas pessoas que conhecíamos somente pelo virtual. Toda essa demonstração de carinho, amizade, cumplicidade muito me ajudou e ainda ajuda. Tenho amigas virtuais que viveram a perda dos filhos e nesta dor nos unimos. Eu acredito que ajuda muito sim, pois ficamos sabendo que não estamos sozinhas na dor que acreditamos não passar nunca. Teremos de aprender a conviver com ela e levar a vida em frente. Eu ainda continuo me correspondendo com essas pessoas e trocando experiências. Sempre surge alguém novo que está precisando de ajuda e nos propomos a ajudar.




Segunda parte:


1. Sra. Antonieta, a senhora acredita que em algum momento o Cristiano possa ter se sentido desmotivado ao analisar o histórico de postagens no site,e constatar que a evolução do câncer se tornava cada vez mais evidente?

Não. Em momento nenhum percebi desmotivação no Cristiano. Depois da cirurgia na coluna ele foi obrigado a ficar em casa, pois a paraplegia não o deixou mais voltar ao trabalho. Então ele passava os dias no computador trabalhando em casa e a cada mensagem que recebia no livro de visitas ele comentava comigo. Principalmente as mensagens dos amigos que ele mais gostava e das pessoas que eram virtuais e tomava conhecimento da sua luta.
A cada recidiva da doença eu tentava passar para ele que era uma provação de Deus e que iríamos vencer confiando em Deus de Misericórdia. Eu percebia que ele acreditava e aguardava com paciência, sem reclamar a vontade de Deus em sua vida.
Este texto ele me escreveu no dia 31 de maio de 2008

"mãezinha

Pra começar, EUTEAMO sei que vc vai brigar comigo, mas desculpa por este trabalho todo. Não tenho culpa de ta fazendo isso tudo. ta difícil pra mim qto pra vocês, mas fazer o que?? Estou rezando e pedindo pelo menos um alivio de tudo isso porque ta muito sofrido pra mim. Eu não sei mais onde to arrumando forças pra superar esta fase tão difícil de todas que já passei, antes era só não andar, agora alem disso, não escuto, não tenho forças e não consigo me alimentar direito. não sei o q esta acontecendo, mas o vestibular pro céu ta bem puxado. Ta exigindo doutorado uai em paciência. Esse ainda eu não conclui, ainda tenho que defender a tese. Mas vamos levando.aquela Luciana da internet, outro dia conversando o com ela, comentei que o Bruno falo que eu tenho paciência de Jó, ela e evangélica né e foi logo me perguntando se eu conhecia a historia de Jó, como eu não conhecia ela me falou resumidamente, e estou com Jó, se Deus deu, só ele pode tirar, e se esta acontecendo isto comigo, é a vontade dele que esta agindo na minha vida. O que posso fazer? Nada, aceitar isso tudo. Mas continuo pedindo para q ele me alivie de todo este sofrimento.

Eu só quero que saiba que te amo mais que tudo deste mundo também.
Cristiano."


2. Atualmente, qual é a sensação de visitar o site do Cristiano?
A senhora acha que este site confere algum conforto para familiares e amigos por conter escritos dele?


Eu mantenho o site no ar e gerencio-o todos os dias. Para mim é estar em contato com meu filho no dia a dia. Sinto-me bem e acredito que as pessoas que voltam acessar sejam também para sentir uma forma de contato e matar saudades por saber que aquele instrumento foi criado por ele.

3. Em sites de relacionamento como o Orkut, existem comunidades dedicadas à pesquisa de" perfis póstumos", a exemplo da Profiles de gente morta, onde os usuários buscam informações a respeito do falecido,como causa e circunstâncias de morte. A senhora se sentiria ofendida se o perfil do Cristiano fosse exposto em uma dessas comunidades?

Eu não gostaria de expor a vida do Cristiano no Orkut não. Não se trata de sentir ofendida, mas de respeito à memória dele. Sei que ele não gostaria de participar.

4. A senhora acredita que o fato do Cristiano não ter resistido ao câncer pode desmotivar outras pessoas?


Não. Nestes anos de tratamento com meu filho convivi com vários doentes e todos eles demonstram muita vontade de viver e acreditam na cura. Mesmo sabendo de muitos que não conseguem vencer a doença, a maioria deles não desanimam.